Nuno Castel-Branco é um nome muito conhecido no sector automóvel em particular por dirigir uma marca que é das maiores referências do Sector Automóvel Português. Este ano estará de volta uma vez mais à Convenção da ANECRA para partilhar o seu seu profundo know-how. Nesta entrevista, procurámos saber que avaliação faz do mercado atual e da sua previsão para o futuro do mesmo.
Quais são as prioridades no mercado automóvel?
O que ainda falta fazer a nível político ou privado
ou, até, associativo?
Acima de tudo, o mercado automóvel demonstra um
dinamismo e resiliência impressionante, uma consequência
dos bons intervenientes que atuam nesta área,
em Portugal. Embora ainda haja temas para resolver,
até porque a inovação não pára e isso traz consigo novos
desafios todos os anos, é importante termos noção
do trabalho competente que tem sido feito por todos
os profissionais.
No entanto, respondendo diretamente à pergunta,
diria que uma maior coordenação entre associações
só iria beneficiar o sector. Um alinhamento forte iria
reforçar a influência junto do Governo e trazer resultados
para o mercado nacional. Dando apenas um
exemplo, hoje em dia nenhuma casa se compra sem
alguns certificados que comprovam o estado do imóvel.
No mercado automóvel, sentimos que ainda falta
algum deste mesmo critério nas transferências de propriedade
para proteger o consumidor, mas também o
profissional que trabalha com base na transparência.
A dinâmica de mercado está hoje alterada comparativamente aos últimos anos, com uma oferta acima
da média face à procura. Como podemos antecipar
2024 em relação aos novos e usados?
Em relação aos usados, parece-me consensual que os
preços vão cair, muito consequência dessa mesma dinâmica
de mercado, com mais oferta do que procura,
e com algum produto a atingir dias em parque muito
acima do habitual, que por si só gera a necessidade
de serem vendidos rapidamente. Os operadores vão
começar a ter stocks mais curtos, uma vez que vão
precisar de mais tempo para vender um carro e focar
nos carros com preços mais acessíveis ao consumidor,
porque têm um menor “market days supply” ou seja,
um menor tempo estimado de venda. A importação
deverá baixar para os níveis de 2019, uma vez que temos
novamente a oferta nacional estável, no entanto,
estes três anos de muita importação abriram novas
parcerias, o que nos leva a acreditar que alguns operadores
ainda mantenham este canal ativo. Os elétricos
usados vão ter a sua procura a abrandar, porque
continuam com preços elevados e porque é onde existem
as reduções de preço mais agressivas em novos.
Contudo, esperamos mais oferta disponível, muito
através das empresas de gestão de frotas. Em relação aos novos, em primeiro lugar, temos de perceber que
as vendas em 2023 não representam a realidade da
procura, isto porque os números foram inflacionados
pelas encomendas dos anos anteriores. Assim, não
podemos ser tão otimistas e imaginar que a tendência
manter-se-á em 2024. Espera-se uma redução de
conversão e o regresso de descontos mais elevados.
Os eletrificados já representam 50% e espera-se que
a tendência se mantenha. Por último, o mercado será
suportado pelo lado empresarial, frotas e RAC, com
os particulares a representarem provavelmente menos
de 20% das vendas totais.
O Standvirtual vive no digital. Qual a importância
deste canal na atualidade e como avalia a adoção e
utilização por parte dos operadores nacionais?
O digital não é mais uma novidade para o operador
nacional. A adoção é praticamente total e, se dúvidas
houvessem, a pandemia veio provar que o mercado
estava preparado para trabalhar o digital de forma
séria. O que vemos são muitos clientes preocupados
com o formato vídeo, com as suas redes sociais, com
os seus websites próprios, com a sua imagem e experiência
de compra no digital. Usando o Standvirtual
como exemplo, vemos estratégias digitais pensadas
em cima da nossa plataforma através das opções de
promoção e publicidade clássicas que temos disponíveis
e decisores cada vez mais recetivos a novas soluções
como as “feiras digitais” ou o branded content.
A importância do canal é enorme e ficará cada vez
maior à medida que também cresça a venda à distância,
na preferência dos consumidores, que na minha
opinião tende a crescer ano após ano.
Temos observado um discurso cada vez mais focado
em desenvolver o perfil analítico dos clientes.
Tem como ambição fornecer e contribuir para um
mercado cada vez mais baseado em dados?
Sem dúvida. Essa é uma das nossas missões. A nossa
plataforma gera tanta informação que seria um
desperdício não colocar o máximo de dados e indicadores
possíveis à disposição dos profissionais. A
ferramenta Marketview apresentada oficialmente este
ano, em janeiro, no Standvirtual Summit, tem um
enorme potencial para o mercado e foi uma grande
evolução face ao que disponibilizávamos antes. No
entanto, este incentivo não tem só a ver connosco,
mas também é uma realidade que alguns profissionais
ainda não estão habituados a usar dados de mercado
para complementar a sua intuição. Num estudo recente
que fizemos com a Marktest e uma amostra de clientes, percebemos que 23% dos entrevistados não
quer usar os dados como uma origem para tomar decisões
e 15% não usa, mas gostaria de o fazer. Estamos
a falar de 38% que toma decisões unicamente através
do seu instinto, que embora deva ser valorizado
e ouvido, pode ser complementado com informação
atual. Para nós é um número demasiado grande para
um mercado evoluído como o nosso. Sabemos a importância
da análise para o sucesso de uma empresa
e, em empresas do mercado automóvel, onde saber
comprar é ainda mais importante que saber vender,
resta-nos aconselhar o máximo possível para que os
nossos clientes possam ter este perfi l e hábito saudável,
de conhecer os números, as tendências e as dinâmicas
de mercado, para fazerem as melhores decisões
possíveis com os recursos que têm.
A ideia que passa é que o Standvirtual não quer ser
apenas um marketplace. Na sua visão, qual é o papel
desta marca no mercado nacional?
Com quase vinte anos de existência, não podemos
ser responsáveis apenas por entregar contactos aos
nossos clientes. Isso seria demasiado curto. Temos
um papel diferente que passa muito com o que falávamos
na pergunta anterior: entregar informação,
conhecimento e orientação. É por isso que mesmo
sendo uma empresa privada, o Standvirtual entrega
tanto valor de forma aberta e gratuita. Temos um livro
publicado sobre métricas e vendas que é oferecido a
qualquer profi ssional, criamos webinars, entrevistas,
eventos, fóruns e debates para falar dos temas da atualidade
com os principais protagonistas, temos relatórios
mensais, semestrais e anuais, lançamos estudos,
temos formações regulares e regionais. Publicamos
conteúdos todos os meses e trabalhamos muito perto
das associações e dos operadores para compreender
o que se passa no país e no mercado automóvel em
geral. É assim que vemos a marca no mercado, sempre
disponível para trilhar o caminho da inovação.
Qual é o maior desafi o de estar à frente de uma organização
como o Standvirtual, tão relevante e há
tantos anos no mercado?
A maior difi culdade é sempre na procura do equilíbrio.
Sendo uma marca de referência no sector automóvel,
tudo o que fazemos é sentido e amplifi cado
pelos operadores de retalho e marcas. Este equilíbrio
entre a sensibilidade, quer seja em novos ou usados,
com o lado dos consumidores, que naturalmente têm
algumas necessidades que nem sempre são da preferência
dos profi ssionais, é sem dúvida o maior desafi o
de trabalhar no Standvirtual.
Que avaliação faz do papel da ANECRA?
É extremamente importante e muito clara a evolução
nos últimos anos. Sinto uma ANECRA mais ligada
ao sector, mais conhecedora do mercado, com mais
dinâmica e com forte intervenção, essencialmente
na área do após-venda e no retalho dos usados, que
tem contribuindo e dado visibilidade - esta revista
é um exemplo disso - a estas áreas, tão importantes
para a indústria automóvel. E neste elogio à ANECRA,
alargado a todos os funcionários, não posso
deixar de destacar o trabalho do Roberto Saavedra
Gaspar, que com toda a sua experiência no terreno,
trouxe visivelmente uma energia diferente ao papel
da associação.